De todas as manifestações que circularam na internet hoje sobre a descoberta do câncer de Lula, a matéria pública no blog da jornalista Adriana Araújo da Record, foi a melhor de todas. Sensata, coerente e sobretudo humana, Adriana comentou sobre a campanha sugerida nas redes sociais para que Lula se trate no SUS. Muito bem fundamentada a matéria, vale a pena reproduzi-la. Parabéns Adriana! o Brasil precisa de pessoas com a sua integridade.
Lula precisa de silêncio, nos dois sentidos
"Pra quem trata de problemas na laringe - desde uma infecção mais simples até um tumor - o silêncio costuma ser frequentemente prescrito pelos médicos. Mas não é só desse silêncio que Lula vai precisar. O que mais fez falta hoje nas redes sociais foi o silêncio do respeito. Li e recebi, via Twitter e outras redes, comentários muito infelizes sobre a doença do ex-presidente. Fiquei impressionada como as pessoas podem ser cruéis ao comentar sobre a doença de alguém de forma tão desumana. Não importa se presidente, ex-presidente ou um anônimo. Qualquer pessoa doente merece respeito. Sobretudo pacientes com câncer, doença que, apesar do avanço da medicina, fragiliza qualquer um que recebe esse diagnóstico. A campanha que sugere que Lula vá se tratar no SUS - Sistema Único de Saúde - é de mau gosto, pra ser suave. Faltou respeito. Falta informação. O SUS tem muitas falhas, temos muitas razões pra criticar o que não funciona. Mas Lula não merece ser o bode expiatório pra isso. Os comentários tem um tom de revanchismo eleitoral. É a crítica fácil, pronta, basta repetir, entrar no efeito manada "vamos bater no Lula" e pronto. Nem Lula, nem o Brasil merecem. Minha mãe já usou os serviços do SUS para o tratamento de um câncer. Há cerca de dez anos, ela fez uma série de sessões de radioterapia pelo SUS - foi encaminhada ao serviço pelos médicos do hospital particular onde foi submetida a uma cirurgia para retirada do tumor. O convênio pagou a cirurgia. O SUS complementou todo o tratamento de radioterapia. Confesso que minha família ficou bastante surpresa com a orientação do médico para que procurássemos o serviço público. Mas, exatamente como ele havia dito, foi a saída mais rápida e eficiente. E minha mãe, felizmente, está curada. Não melhora o SUS a crítica infundada, sem conhecimento do que se passa nos hospitais públicos. Claro, há milhares de pacientes esperando por atendimento. E cada estado ou cidade tem sua realidade específica. Mas, em termos gerais, o paciente encaminhado para os serviços especiais como radio e quimioterapia tem prioridade. Claro, pra ser encaminhado ao tratamento específico do câncer, aquele paciente vai precisar de exames. Isso complica muito o caminho. A carência por consultas com especialistas faz com que muitos pacientes graves fiquem tempo demais esperando pelo diagnóstico. E, muitas vezes, o problema não é a falta do médico especialista, mas de gestão. Casos mais simples que poderiam ser atendidos em clínicas médicas menores acabam sobrecarregando hospitais e clínicas de especialidades. Porque a clínica do bairro ou não existe, ou está lotada, ou não tem médicos. Não sou nenhuma doutora no assunto. Mas o que escrevo aqui é o resumo do que já ouvi de muitos médicos renomados do Brasil. É essencial discutirmos como melhorar o sistema de saúde no país, como fazer com que o paciente do SUS tenha um atendimento mais humanizado e mais eficiente, mais próximo do que oferecem os hospitais particulares de excelência. Discutir esse assunto de forma responsável é uma tarefa nossa, de cada cidadão, e uma obrigação de qualquer homem ou mulher com cargo público, com vida política ativa nesse país. Mas não vai ser atacando o ex-presidente que vamos chegar a algum lugar. A turma que diz "Lula vá se tratar no SUS" também costuma berrar pra não pagar tantos impostos. Sem discutir profundamente como financiar a saúde. Lamento os comentários que li. E lamento que o remédio que faltou hoje - o silêncio em sinal de respeito - não possa ser prescrito por doutor algum".
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